Uma das definições mais amplamente difundidas e melhor aceites de “Autorregulação Emocional” é a de Daniel Goleman, que propõe que essa competência crítica da Inteligência Emocional consiste na “capacidade de gerirmos as nossas emoções de modo a facilitarem, e não a interferirem, nas missões e tarefas que temos em mãos”. Como, de acordo com a generalidade dos autores, as emoções não constituem apenas modos de sentimento, mas também modos de pensamento, há lugar para sustentarmos, sem doses excessivas de imaginação e com um razoável suporte de observação empírica, que, à semelhança do aforismo que propala a imagem “heroica” da “mulher-sombra” (“por detrás de um grande homem existe sempre uma grande mulher”), também se poderá dizer que por detrás de um “mau comportamento” existe um “mau pensamento”, o mesmo se podendo afirmar do seu inverso.
Dita assim, esta afirmação abre um espaço de inegável otimismo em relação à possibilidade de as pessoas poderem exercer maior autocontrolo sobre as suas emoções, e as consequentes ações delas derivadas, suavizando as visões mais catastrofistas daqueles que, afirmando que as dificuldades de autorregulação constituem um dos principais sinais do nosso “mal-estar” pós-moderno, veem na propalada crise de valores atual, os sinais impiedosos de uma mancomunação civilizacional com o anticristo.
Vale a pena, por isso, alertar as consciências (e, sobretudo, as vontades) para os fatores que, direta ou indiretamente, contribuem para acelerar o efeito de “depleção do ego”, definido por alguns autores como a natural limitação que cada ser humano tem para controlar os próprios impulsos emocionais e evitar erros que, com “cabeça mais fria” e “ânimos menos exaltados”, seriam mais facilmente autorregulados.
É o caso de um dos mais insidiosos e inquietantes que dá pelo nome de “piratas emocionais”, que são aqueles fenómenos que, invocando uma expressão icónica de um anúncio de televisão de há anos atrás (peço desculpa pelas minhas referências culturais de “baby boomer”), não têm “dias nem horas” para se manifestarem, irrompendo sem pré-aviso nem cerimónias no nosso campo de consciência.
Como o próprio nome indica, e evocando as ressonâncias dos seus homónimos aventureiros dos “mares da Caraíbas”, os ditos “piratas emocionais” são pensamentos ou emoções (seria mais rigoroso dizer pensamentos com intenso significado emocional) que, inadvertidamente (e, muitas vezes, inconscientemente) interrompem o fluxo da consciência, impedindo a pessoa de concretizar a estratégia de ação que tinha previamente delineado.
Para “as pessoas perceberem”, como diz o comentador político Marques Mendes, pensemos naquelas situações em que, após termos proferido o heroico “é hoje” de todas as decisões adiadas (deixar de fumar, fazer exercício físico, mudar o tal comportamento em que a nossa mulher insiste há tanto tempo e passar pelo menos um dia sem comer uma “mousse au chocolat”) cedemos, numa “curva do destino” aos imperativos de uma tal força que “nasce não sei onde, vem não sei como” e nos faz claudicar mais uma vez, sem sabermos bem porquê.
Quando acontecem situações destas (recorda-se, leitor, da sua última?) é normal arranjarmos “alibis honrosos” (tipo, “isto só aconteceu porque…”), ou seja, mensagens que enviamos a nós próprios e que, para além de aliviarem a má consciência e mandarem o nosso “locus de controlo” para a Patagónia, vão também mascarando a verdade incómoda que não queremos revelar a nós próprios: a de que pertencemos àquela categoria de pessoas que usa a procrastinação, ou a tendência sistemática para adiar decisões e ações, como processo de resolução de problemas e de relação com a realidade.
Os “piratas emocionais”, cujas dinâmicas mais complexas não podemos analisar neste espaço, manifestam-se na nossa consciência como “Pensamentos que Interferem com as Tarefas” (PIT) e, apesar de serem fenómenos de natureza subjetiva, o que é facto é que estão na base de muitas das barreiras e obstáculos, muito concretos e objetivos, que limitam o desenvolvimento de uma maior eficácia pessoal.
Se, como afirmámos no início deste texto, a autorregulação emocional consiste em estratégias de ação que nos vão permitir gerir as emoções de modo a que não interfiram negativamente nas tarefas que temos em mãos, então a solução passa por substituir os PIT (“Pensamentos que Interferem com a Tarefa”) por outros, mais antropogénicos e saudáveis, que, em vez de prejudicarem as tarefas que temos em mãos, possam, pelo contrário contribuir para as fazermos melhor: os “PAT”, ou seja, “Pensamentos Ativadores da Tarefa”.
“Voilá”! Nada como uma receita simples, num invólucro putativamente sugestivo e breve, para vivermos melhor. Quanto à questão de saber como é que se faz...isso é uma boa matéria para outro texto do blog.