Com uma experiência de mais de 30 anos junto de colegas, equipas, alunos e gestores, Miguel Faro Viana é atualmente responsável pela Área de Formação Corporativa e Gestão do Conhecimento da Academia IP - Infraestruturas de Portugal. Apaixonado pelo que faz, admite que a área de Recursos Humanos faz parte da sua identidade e que um dos aspetos que mais o motivam é a possibilidade de poder partilhar diariamente não só os seus conhecimentos como também a sua experiência e os valores de vida.
Paralelamente à paixão pela Gestão das Pessoas e as principais tendências e desafios que a acompanham, o nosso entrevistado – que é também um exímio saxofonista – partilha neste artigo as principais lições que a música Jazz nos deixa sobre liderança.
– O que é que o motivou (e continua a motivar) a abraçar profissionalmente a área dos RH?
Miguel Faro Viana (MFV): Não me consigo ver hoje em dia a desempenhar outro papel profissionalmente que não este. Ser RH faz parte da minha identidade e vou continuar nesta atividade até me retirar profissionalmente. O que mais me motiva hoje em dia é a partilha dos meus conhecimentos e das minhas experiências de mais de 30 anos com os meus colegas, equipas, alunos e gestores. Procuro sempre saber coisas novas e estar a par das novas tendências e desafios de setor mas, no fim dia, é transmissão do meu saber e dos meus valores de vida que mais me entusiasma e gratifica.
– Dada a sua larga experiência, quais acredita serem os principais desafios que as organizações enfrentam, no que toca ao recrutamento, desenvolvimento e retenção de talento?
MFV: A resposta só aparentemente é fácil. Na minha opinião não o é porque a diversidade de contextos organizacionais e de negócio com que nos podemos defrontar é enorme. Podia falar-lhe do impacto para a gestão de pessoas que representam fenómenos como as novas gerações que estão a chegar ao mundo do trabalho, ou o impacto da digitalização nos processos de trabalho ou a gestão do talento mas, a realidade é muito mais diversa e complexa. Para além disso, estes temas não são verdadeiramente novos, apenas têm uma nova roupagem. No entanto, o desafio verdadeiramente recorrente com que me tenho sempre defrontado é a importância crítica que a gestão das pessoas assume nas organizações. A chave do sucesso são as pessoas. O ativo mais importante são as pessoas. O problema é por estes princípios em prática e defender sem vacilar os valores do respeito, justiça, segurança, autonomia e desenvolvimento individuais e conciliá-los com as necessidades da organização.
– Estando muito ligado ao ensino universitário, lida constantemente com novas gerações. Quais as principais tendências de RH que observa nestes que serão os talentos do futuro?
MFV: O principal desafio é ser-se capaz de lidar com o dilema que representa a necessidade da organização de ter colaboradores comprometidos e empenhados e a necessidade das novas gerações em manterem algum desprendimento e autonomia face à organização. Penso que as organizações ainda não mudaram o seu registo e não foram ainda capazes de acomodar a necessidade dos jovens em manterem uma clara separação entre o seu papel enquanto profissionais e os outros papéis que valorizam igualmente, senão mais ainda.
– No futuro, quais pensa que serão as competências humanas mais valorizadas nos colaboradores?
MFV: A capacidade para lidar com os paradoxos organizacionais sem deixar de se criar valor para a organização de pertença. Por exemplo, ser flexível sem perder de vista aquilo que de facto é importante. Ser inovador sem deixar de assegurar as rotinas e o “brick and mortar”. Ser especialista, profundamente conhecedor de um conjunto de matérias, sem deixar de ser curioso e aberto a novas experiências e aprendizagens. Ser confiante e proativo sem perder a modéstia e estar atento aos outros. Ter uma atitude colaborativa e integrativa nas relações interpessoais sem perder a capacidade para estimular a mudança e a orientação para resultados. Estes são apenas alguns dilemas que invadem permanentemente as nossas experiências profissionais.
– Ao ser saxofonista e um conhecido amante do Jazz, é capaz de partilhar connosco quais as principais lições (e inspirações) que a música nos pode deixar sobre liderança?
MFV: A música em geral e o Jazz em particular são metáforas poderosíssimas que nos ajudam a ver a realidade sobre outras perspetivas. A essência do Jazz é a improvisação, o que apela à inspiração e criação no momento, dimensões essenciais da atuação de um líder. O Jazz é uma forma de linguagem musical que obriga a uma aprendizagem abnegada ao longo de anos, que implica por sua vez uma grande disciplina, treino, experimentação e um espírito constante de autocrítica, modéstia e superação. Estas são também características essências do chamado líder de nível 5. Tocar Jazz é saber ouvir e comunicar com os outros músicos, é saber acompanhar ou liderar conforme os momentos. A liderança hoje em dia não se compagina com cargos e funções permanentes. Há alturas para liderar e ocasiões para delegar e passar a responsabilidade a terceiros.
Uma última metáfora poderosa é a capacidade para assumir riscos e confiar em si mesmo. O papel do líder é, muitas vezes, solitário e realizado sem rede. A capacidade para intuir, arriscar e responder rapidamente sem nunca perder a confiança em si é fundamental na música Jazz.
Sobre Miguel Faro Viana
Miguel Faro Viana é licenciado em Psicologia e doutorando na área de Psicologia das Organizações no ISPA - Instituto Universitário ISPA. Possui ainda formação pós-graduada em diversas áreas da Gestão e dos Recursos Humanos. É responsável pela Área de Formação Corporativa e Gestão do Conhecimento da Academia IP - Infraestruturas de Portugal.
Foi diretor de Recursos Humanos da REFER, Santa casa da Misericórdia de Lisboa, Unisys Portugal e Plataforma de Televisão Digital Portuguesa. Foi ainda consultor nas empresas SHL Portugal, Mercer e Arthur Andersen. É ainda professor convidado do curso de Psicologia no ISPA - Instituto Universitário na área de Psicologia Social e das Organizações.